SIMPLES COMO AMOR
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Lances Nada Inocentes
Rotina, diga-se de passagem, era uma coisa que Malu adorava. Gostava de se sentir segura. De ter tudo absolutamente planejado e estruturado. Detestava surpresas e imprevistos. Isso era fato.
Chegou à Escola Nacional de Circo, na Praça da Bandeira, onde dava aulas de trapézio fixo e acrobacia de solo, e foi direto para o picadeiro. Alguns alunos já esperavam, conversando e se aquecendo preguiçosamente sentados em cima dos tatames, porque afinal de contas, ainda era cedo, e alguns vinham de muito, mas muito longe, mesmo.
As aulas correram sem maiores atropelos. As turmas já estavam bastante avançadas nas acrobacias de solo, a maioria dos alunos até já fazia flip-flap (salto em que o acrobata pula para trás e passa pelo apoio das mãos caindo em pé, muito parecido com o “macaco” da capoeira) sem lonja (corda que serve como proteção) na cintura.
Depois houve duas turmas de trapézio fixo. Quase todos os alunos também já eram capazes de realizar figuras, truques e quedas individuais sem esforço.
Malu almoçou, e de tarde, tudo de novo. Quando saiu, às dezesseis horas, foi direto para a Hebraica, em Laranjeiras, onde estava dando aula de acrobacia aérea — mais especificamente tecido — para alguns alunos, na maioria atores performáticos, entre eles Kiko.
Fizeram um aquecimento caprichado, porque era muito fácil conseguir uma distensão sem isso, o esforço muscular necessário era realmente pesado. Malu subiu no tecido, e mostrou a sequência de movimentos, para que os alunos repetissem. Assim que desceu, Kiko falou baixinho:
— Se a charutão te visse fazendo isso... Com certeza ela teria um troço...
— Cala a boca, Kiko.
Foi a merecida resposta. Seguida de um arrepio que ela disfarçou do amigo. Causado pela simples menção e lembrança da mulher que não conseguia tirar do pensamento. Por mais que isso parecesse absurdo e esquisito.
A semana inteira passou naquele ritmo. E terminou na sexta à noite, com Malu mergulhada até o pescoço, relaxando na banheira.
Kiko entrou no banheiro, sem bater na porta. Como fazia sempre. Malu não ligava, eram amigos há séculos e tinham total intimidade.
Um perfume fortíssimo exalava dele. Malu não teve como deixar de implicar:
— Bicha, uma pessoa alérgica não pode nem chegar perto de você assim...
— Queridinha, perfume bom não dá alergia... Só essas porcarias que você usa...
Malu espirrou água em Kiko, que se esquivou habilmente. E disse:
— Tá dizendo que meus perfumes são ruins, é?
Na mesma hora, Kiko respondeu, batendo as mãos e depois com o dedo em riste, de um jeito muito afetado, mesmo:
— Mona, presta atenção no que eu vou te dizer: você tá solteira! Ficar usando Calvin Klein “Be” e “One” não vai te ajudar, não...
Malu soltou uma gargalhada antes de sair da banheira, se enrolar na toalha e ir para o quarto, seguida por Kiko, que continuou, dizendo:
— Você precisa é de um Victoria Secret... Ou então um Versace: Red Jeans for Women... Algo bem doce, bem feminino... Já sei: Loulou! Esse é in-fa-lí-vel!
Foi quando ele arregalou os olhos, ao ver Malu abrir o armário e pegar uma camisola:
— Mas o que significa isso? Sexta à noite e a senhorita pretende ficar em casa dormindo?
Antes que Malu pudesse dizer qualquer coisa, Kiko jogou a camisola dela de volta no armário, gritando:
— Nada disso! Meu bem, você vai sair comigo.
Vasculhou as roupas dela à procura de algo que servisse. Malu tentou protestar, recusar, mas não foi ouvida.
Kiko já estava estendendo um dos poucos vestidos de noite que Malu tinha — a maioria das roupas dela era de malha, mais esportivas — dizendo:
— Vai se vestir sozinha ou prefere que eu te vista à força, hein?
Enquanto Malu obedecia, ele revirava a gaveta de calcinhas:
— Minha Nossa Senhora do corta tesão! Pudera que você e a Laura nada... Qualquer um brocharia ao dar de cara com uma coisa dessas...
Disse, estendendo uma calcinha de algodão grande e velha — estilo Bridget Jones — mas muito confortável. Que Malu tentou pegar, dizendo:
— Pára, viado! Me devolve!
— Nada disso! Diga adeus a essas aberrações!
Com um saco plástico na mão, ele ia pegando e se livrando das calcinhas que Malu mais gostava, dizendo:
— Fora!... Fora!... E... Fora!
Deixando a gaveta praticamente vazia. Deu um nó no saco, completando:
— Queridinha, primeira lição: mulheres solteiras como nós não podem se arriscar usando coisas horrorosas como essas. Temos que estar preparadas sempre!
Malu ainda tentou argumentar, dizendo que para o dia a dia era melhor usar calcinhas de algodão. Chegou a apelar dizendo que era a própria ginecologista afirmava isso...
Kiko então parou, e falou — com um tom de voz absolutamente fatigado, como se estivesse fazendo uma enorme concessão:
— Tudo bem. Quer usar calcinha de algodão? Que pelo menos seja preta, então!
E saiu do quarto de Malu em direção à lixeira do prédio, onde impiedosamente despachou o saco de calcinhas velhas para sempre.
Depois voltou, e andou ao redor de Malu, suspirando e dizendo:
— Ai, eu não entendo... Se eu tivesse nascido mulher, meu amor, ia andar maquiada o dia inteiro! Ah, e ia ter unhas cumpridas, sempre pintadas de vermelho...
Malu olhou para as próprias unhas. Cortadas curtinhas, sem esmalte, nenhuma frescura do gênero. Antes de dizer:
— Ah, bicha, não enche!
Kiko a ignorou completamente. Puxou-a para o quarto dele:
— Vem! Vou te maquiar e tentar dar um jeito nisso que você chama de cabelo.
Sabendo que nem adiantava tentar resistir, porque quando o amigo botava uma coisa na cabeça era melhor obedecer, Malu se deixou maquiar por ele.
Sacudindo o pincel do blush como um pintor diante do quadro, Kiko falou:
— Minha irmã tinha uma Barbie Face. Quando ninguém estava vendo, eu ia lá escondido e... Tá, eu sei o que você deve estar pensando. Mas a gente se maquiar não é igual... Maquiar os outros é muito mais divertido, meu bem. Ai, pra que Barbie Face, não é? Agora eu tenho você...
Malu riu, e imediatamente, levou uma bronca:
— Não se mexe, racha! Ai, meu Deus!
Quando terminou o “make up”, Kiko soltou o eterno rabo-de-cavalo de Malu, encheu a mão de mousse, e bom cabeleireiro que era, pegou um pente e de uma forma surpreendente, ajeitou os cabelos castanhos. Olhou-a, dando uns retoques aqui e ali, borrifou o tal perfume “Loulou” nela, e fechou com um:
— Voilá! Parfait!
* * * *
Malu estava ansiosa quando entraram na boate. A mesma em que tinham ido na última sexta. Por uma insistência velada, mas perceptível dela.
Alimentando uma vontade de reencontrar a mulher dos charutos, que apesar de inconfessável, era... Absolutamente incontrolável.
Estranhamente, Kiko concordou sem uma piada sequer. Não percebendo ou fingindo — quem sabe? — não perceber.
Sentaram no balcão, o mesmo, onde da outra vez, a charutão estava. Pediram duas Smirnoff Ice e ficaram ali, bebendo e observando o movimento. Para variar, nada interessante.
Kiko riu, percebendo a falta de paciência de Malu. Explicou como se estivesse dando aula a uma criança:
— Cinco anos e você desaprendeu tudo? Tá achando que Angelina Jolie vai aparecer aqui na sua frente, queridinha? Liga seu periscópio! Esqueceu? Tem que peneirar, amiga...
Periscópio... Peneirar... De repente, Malu se via de volta a uma vida que ela considerava ultrapassada. Uma vida antes de ser casada, antes de Laura, quando tinha 27 anos e tudo ainda parecia tremendamente engraçado e divertido. Mas que naquele momento, causava uma melancolia insuportável. O suspiro que soltou foi tão alto, que Kiko a olhou. Como se não acreditasse, repreendeu-a:
— Minha Nossa Senhora da depressão! Desmancha essa cara de funeral, meu bem!
Nesse momento, a expressão de Malu mudou tão completamente, que Kiko até se espantou. Os olhos dela acompanharam em silêncio alguém que entrava na boate.
Imediatamente, Kiko quis ver quem. Voltando a olhar chocado para Malu ao ver que não era ninguém mais ninguém menos que... A charutão.
— Fecha a boca, Malu. Menos...
Foi a primeira coisa que ele falou. Malu obedeceu rapidamente. Bem a tempo da mulher dos charutos se aproximar, encostar ao lado dela no balcão e pedir uma cerveja. Sem olhar para Malu, como se nunca a tivesse visto.
A mulher pegou a long neck, o braço encostando-se ao de Malu sem querer. E Malu, involuntariamente, estremeceu.
Quando a outra se afastou, Kiko não teve como deixar de dizer:
— A charutão mexe mesmo com você, hein?!
Mas Malu nem respondeu. Apenas bebeu o resto da Smirnoff Ice de uma só vez.
Três garrafinhas iguais depois... Kiko estava ao lado dela em altos beijos com um careca fortíssimo, que era, sem dúvida, a bicha com mais cara de Pit Boy que Malu já tinha visto.
— Vou dar uma volta.
Disse, sem ter certeza se o amigo tinha escutado ou não. Andou pela boate, os olhos procurando, e indo parar, certeiros, numa das mesas. A mulher estava sentada, de charuto na mão, conversando com um rapaz elegante, muito bonito.
Malu se assustou quando uma loira parou na frente dela, toda sorrisos:
— Oi!
— Oi... — respondeu, sem desgrudar os olhos da mesa da charutão.
— Você é linda, sabia?
— Ãh?
Foi a resposta de Malu, absolutamente sem prestar atenção. A loira a segurou pelo braço, e esperou Malu olhar para ela antes de repetir:
— Eu disse que você é linda.
Malu nem agradeceu. Só percebeu que a loira tinha um cigarro na mão. Pediu:
— Me dá um cigarro?
— Claro.
A loira entregou o cigarro sedutoramente. Depois aproximou o isqueiro, mas Malu a impediu de acender:
— Obrigada... Fico te devendo.
E se afastou, deixando a loira sem entender. Movida pelo álcool, curiosidade, desejo ou as três coisas, Malu se aproximou da mulher dos charutos. Parou na frente dela, que levantou os olhos, percorrendo-a inteira, antes de olhá-la nos olhos profundamente. A voz de Malu saiu um pouco trêmula ao dizer:
— Tem fogo?
A mulher olhou para o cigarro que os dedos trêmulos de Malu estendiam, e respondeu com um sorriso malicioso, de pura libido:
— Sempre.
O rapaz na mesa riu. A mulher abriu um zippo, acendeu e esperou. Malu se inclinou, encostou o cigarro na chama, sentindo os olhos da outra queimando ao entrarem profundamente no decote do vestido preto que estava usando.
Por um breve instante, os olhos se encontraram novamente. Antes de perceberem que o cigarro que Malu segurava estava pegando fogo, porque... Malu tinha acendido do lado errado.
Com uma rapidez incrível, a mulher arrancou o cigarro da mão de Malu, o jogou no chão e pisoteou com a boot preta. Apagando aquele incêndio, mas não o outro. O que queimava Malu por dentro, e que a cada movimento da outra se tornava ainda mais intenso.
— Não quer sentar?
A voz do rapaz tirou Malu da quase hipnose em que se encontrava. Sentou na cadeira que o rapaz puxou apesar da mulher olhar para o amigo sem esconder o desagrado.
Ignorando a outra completamente, o rapaz estendeu a mão para Malu, dizendo:
— Prazer. Eu sou o Pedro. E você é?...
— Maria Luiza. Mas pode me chamar de Malu — respondeu, apertando a mão dele, que ao contrário da amiga, a olhava com simpatia.
Pedro olhou significativamente para a mulher na frente dele, que continuou calada. Antes de dizer:
— Desculpe a falta de educação da minha amiga. O nome dela é Angela.
Um sorriso surgiu sem querer nos lábios de Malu, porque... Aquele nome não tinha nada a ver com a mulher de gel no cabelo, camisa da “Cavalera”, calça jeans e botas do exército com um charuto na boca.
Angela pareceu ler os pensamentos dela, porque falou:
— Meus pais não podiam adivinhar, não é mesmo?
E riu gostosamente. Foi nesse momento que Kiko apareceu. Ficou parado, estático, do lado de Malu, olhando fixamente para Pedro. Tentou disfarçar inutilmente:
— Amiga, te procurei por toda parte, e...
Malu se levantou e disse para Angela e Pedro:
— Com licença...
E puxou Kiko para um canto. Exagerado como sempre, ele disse:
— Menina, quem é esse deus grego? Me apresenta!
Pedro seguiu Malu com o olhar antes de perguntar para Angela:
— Que foi? Tá doente? Esnobando uma gata dessas que, diga-se de passagem, tá se atirando em cima de você?
Com um sorriso cínico, Angela respondeu:
— Já peguei, meu querido... E como você sabe, não gosto de repetir.
A reação de Pedro foi rir. Sem muita surpresa. Afinal, nos últimos dois anos, a amiga estava assim mesmo. Absurdamente sarcástica, fria ao extremo. De um jeito que não tinha sido sempre. A causa do ceticismo dela se resumia a um nome: Taís. Mas isso era uma coisa que só os dois sabiam.
Pedro não perdoou. Disse:
— Ah, o amor! E o medo dele...
Sem conseguir o efeito desejado, porque Angela não se abalou. Pelo contrário, saiu-se com uma resposta à altura:
— Por que é que bicha adora essas coisas melosas? Quer saber? O amor que se foda! Quero aproveitar a maravilhosa era das pessoas descartáveis!
Os olhos dela já tinham um alvo. Iam e voltavam de um ponto fixo, que Pedro seguiu. Uma morena que estava parada atrás dele, numa roda de amigos, correspondendo totalmente aos olhares de Angela. Pedro riu como quem diz: “você não tem jeito”, antes de implicar:
— E nada de reciclagem...
Angela riu sem tirar os olhos da garota, de um jeito absolutamente predador. Bateu no ombro do amigo, levantou-se e se despediu, dizendo:
— Com licença, eu vou à luta...
Antes de se aproximar da morena como um felino se aproxima da presa.
Assim que Angela se levantou, Malu parou de prestar atenção em Kiko, que continuava elogiando Pedro, implorando para ser apresentado a ele.
Viu quando a outra se aproximou e começou a flertar com uma morena inacreditavelmente bonita.
A morena pegou Angela pela mão e a puxou para a pista, onde começaram a dançar ao som de “Lady Marmalade” (Moulin Rouge Soundtrack). Do nada, outra menina se aproximou, insinuando-se também. Angela a recebeu com aquele olhar safado que fazia Malu sentir arrepios.
Malu ficou parada, observando Angela dançando com as duas mulheres, beijando-as na boca alternadamente.
Então, num impulso absolutamente instintivo, que deixou Kiko perplexo — como ele confessou depois — Malu caminhou até Angela, e começou a dançar com o corpo colado no dela, sorrindo maliciosamente e umedecendo os lábios, provocando.
A resposta de Angela foi aproximar os lábios dos de Malu... Apenas para desviar a boca, rindo, e se afastar logo depois.
Aquilo fez com que Malu sentisse uma raiva tão grande que a cegou. Começou a dançar no meio da pista, se insinuando para as garotas que estavam com Angela de um jeito irresistível, fazendo com que as duas a deixassem para dançar com Malu.
Angela observou os movimentos da outra com os olhos brilhando e um sorriso de prazer profundo. Entendendo e adorando o jogo que Malu estava propondo.
Com uma intimidade que deixou Malu sem forças, puxou-a suavemente pela cintura e começou a dançar com ela, descartando as outras duas. De um jeito completamente excitante, seguro, enfeitiçante. Colando o corpo no dela, deslizando uma das mãos sensualmente pelas costas de Malu...
Malu estremeceu sem deixar de mover o corpo contra o de Angela. Se insinuando também, abraçando-a e puxando para que as bocas se encontrassem finalmente. Fechou os olhos antecipando o beijo, mas Angela apenas roçou os lábios nos dela.
As peles se arrepiaram, dominadas por um calor pulsante. Malu deixou escapar um suspiro, antes de voltar a abrir os olhos. Angela a olhava como se fosse devorá-la. Os olhos queimando.
Malu correspondeu passando os braços languidamente ao redor do pescoço dela, a respiração suplicante, o olhar prometendo uma entrega sem reservas nem cobranças.
Angela não aguentou. Mergulhou a boca na de Malu com uma súbita urgência, num beijo tão intenso que até respirar se tornou absolutamente irrelevante.
SIMPLES COMO AMOR
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